POR: ALANA MOTA
COMO ME TORNEI UM CAPITÃO DA AREIA
Não fazia muito tempo
que eu tinha perdido meu pai, ainda me lembrava todas as noites, como ele chegava em casa e o
Zé fuinha corria e pulava no colo dele, às vezes ele trazia um saquinho de balas
de menta pra mim e pro meu irmão,era engraçado ver como isso fazia a gente ficar
feliz pelo resto da semana.
Foi tudo muito
rápido, a bexiga chegou e tirou meu pai de mim. Não me dei o direito de chorar,
minha mãe e meu irmão precisavam que eu fosse forte, já tinha tristeza demais
naquela casa e a gente tinha que seguir em frente, ou pelo menos era pra ter
sido assim...
Mal tinha levado
o meu pai e agora essa maldita doença veio levar minha mãe também. Eu não tinha
mais esperança, sabia que minha mãe não iria aguentar por muito tempo, mas eu
queria que meu irmão ficasse ao lado dela o máximo que pudesse, ele ainda era
tão pequeno e já estava sofrendo tanto... Queria que esses últimos momentos com
ela ficassem na nossa memória, e assim foi...
Depois da morte
de minha mãe os vizinhos nos ajudavam muito, levavam comida, roupas, às vezes o
Zé ganhava até uns brinquedos usados das outras crianças, ele ficava na maior
alegria, mas não dava pra viver dependendo da ajuda dos outros, foi aí que eu
decidi procurar algum serviço nas casas onde minha mãe trabalhava, mas ninguém
queria por perto uma filha de bexiguentos.
O tempo foi
passando e as ajudas foram diminuindo cada vez mais, até que não dava mais pra
viver com o que a gente conseguia, me vi tendo que sair de casa e ir para as
ruas com meu irmão, juntamos umas poucas coisas que nós tínhamos e saímos
andando sem saber direito pra onde ir, eu tentava achar um trabalho, mas os
donos da lojas não queriam uma criança atrapalhando seus negócios.
O Zé já não
aguentava mais andar, eu pedi a ele que sentasse e esperasse por mim, que eu ia
atrás de alguma coisa pra gente comer. Fui a uma padaria e o dono até que me
tratou bem, ele me deu uns dois pães pra eu dividir com meu irmão, eu voltei pro
lugar onde eu tinha deixado o Zé e o vi com mais dois meninos, lembro que ele
olhava pra o desenho que um dos meninos fazia, fui pegar ele pra gente ir
embora, mas deu pra ver que aqueles meninos também estavam com fome, então eu
sentei e dividi os pães para nos quatro.
Foi um verdadeiro
banquete para aquelas barrigas vazias, conversamos o tempo todo, um dos
meninos, o que desenhava, se chamava professor o outro chamava João grande,
devia ser pelo seu tamanho, o professor convidou a mim e ao meu irmão pra
passarmos a noite no lugar onde eles moravam, foi assim que eu fui parar no
“Trapiche”.
O lugar era bem
esquisito na verdade, era bem escuro e bagunçado, mas a vista era linda ficava
de frente pro mar, a maresia me trazia várias lembranças; o professor me
ofereceu o cantinho onde ele dormia pra que eu pudesse ficar com meu irmão, mas
era proibido levar garotas para aquele lugar, soube disso assim que os outros
meninos começaram a chegar, eles partiram pra cima de mim e começaram a brigar
entre si, o professor tomou logo a frente para me defender, João grande fez o
mesmo, chegou até a apontar uma faca para os seu irmãos, tudo isso por mim.
Foi ai que ele
chegou, dando ordem pra que todos parassem de brigar, a reação do bando foi
imediata, naquele momento eu tive certeza de que era ele o chefe do bando,
todos tentavam explicar ao mesmo tempo o que estava acontecendo e no meio de
toda a confusão eu ouvi um dos meninos o chamar de Pedro bala.
Ele ouviu a
versão do professor, e acho que reparou o medo nos meus olhos, ele deixou eu
ficar no lugar mas só por uma noite,mas essa noite passou e depois dela vieram
outras e eu ainda continuava no trapiche, já tinha me tornado a irmã e a mãe
daqueles meninos sem família, eu já tinha me tornado parte do bando, já tinha
me tornado uma capitã da areia...
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